Entrevistas

Marcelo Tannure

Marcelo Tannure é mineiro, nascido em Belo Horizonte. Graduado em Comunicação Social, com habilitação em Relações Públicas pela Newton Paiva, atua como professor de Computação Gráfica, sendo free lancer nas áreas de animação, cinema e produção de games. Além de “Lumis, O Vagalume”, “Os Pregos” e a “Lagarta Largada”, Tannure criou as animações do game “Red Light Center”, sob a coordenação da empresa carioca “Day Dream Studios”.  Seus trabalhos podem ser encontrados nos sites www.mtannure.com.br (contato pessoal), www.tirzitis.se/threadsofdestiny e www.daydream-studios.com.br.* 

Os Impublicáveis: Uma breve visita a seu site é suficiente para constatar o fascínio que tem pelas imagens. Porém, verificando seu histórico, emerge uma questão: como foi a transição da posição de espectador para a de criador de suas próprias imagens, por meio das animações?

Tannure: Gosto de cinema e televisão desde minha adolescência, com especial interesse em filmes de ficção. Com uma super 8 na mão e a ajuda de uma agulha, comecei a desenhar meus efeitos especiais numa película; criava armas a laser, produzindo filmes em que os principais personagens éramos eu e meu irmão, que sempre morríamos durante as produções. Depois, acabei vendendo minha super 8 – arrependo-me disso até hoje – e adquiri uma câmera VHS, com a qual dei continuidade a meus trabalhos. Embora hoje me dedique a animações, devo dizer que a criação também flui com a câmera na mão.

Estagiei durante certo período na SLU, onde passei a editar as filmagens dos eventos que lá ocorriam. À época estava iniciando meu curso superior, e o trabalho por mim realizado começou a chamar a atenção dos colegas. Tempos depois, por volta de 1995, adquiri um computador e passei a estudar os programas de 3D, com os quais produzia trabalhos de computação gráfica. Neste período, comecei a interagir com os demais estagiários da SLU, tendo contato com outras áreas da arte, como teatro. Além disso, tinha acesso a revistas sobre cinema, das quais retirava idéias sobre filmes de ficção. O aprendizado era prático, já que não havia cursos técnicos que pudessem me habilitar a essas atividades. A VHS ficou desatualizada e passei a trabalhar exclusivamente com o computador, passando a produzir as animações e os efeitos para imagens de filmes publicitários, o que incluía a criação de vinhetas.

Sempre gostei de escrever roteiros, nos quais bolava meus personagens. O acesso progressivo a computadores mais potentes me possibilitou dar vida a estas figuras, que já habitavam minhas histórias. Neste processo, surgiram “Os Pregos”, que contaram com duas versões. Depois, surgiu “A Lagarta Largada”, um curta de cinco minutos, com o qual consegui o terceiro lugar na “Mostra Múmia de 2005”, além de sua exibição na “Mostra de Tiradentes”. Tratou-se de um filme que não contou com qualquer apoio, razão pela qual me atribuí o 1º lugar moral daquele festival.

Já em 2006, criei uma versão nova para “Os Pregos” e continuei com meu projeto de “Lumis, O Vaga-lume”. Neste trabalho, contei com a ajuda da Banda Cálix, que, através do Sanzio Brandão e do Renato Savassi, me cedeu três músicas de seu novo CD, o que abrilhantou minha animação. Alguns dos personagens dessa obra inclusive formam a banda “Os Iluminados”, tocando uma das músicas cedidas – A Roda. Em “Lumis”, tive dificuldades com a dublagem dos personagens, no que também contei com a ajuda do Marquinhos Baiano, dentre outros, como o Júlio, o Dênis e minha namorada, que foram fundamentais na conclusão da animação. Em suma: contei com a ajuda de muitos de meus alunos na produção desta animação, o que fez crescer os créditos da produção, com a qual alcancei o 2º Lugar do “15º Festival de Cinema de Teresina”, além de me render novo convite para a “Mostra de Tiradentes”, onde o trabalho não foi submetido a júri, mas teve excelente aceitação do público. Com “Lumis”, também fui convidado para o “Festival de Cinema de Pernambuco”, e para o “Digi Festival da Itália”, país em que minha produção já está sendo divulgada.

É o mérito pessoal que me importa nestes festivais, o fato de ter minha obra reconhecida. Só há um problema, nesta busca pela divulgação de meu trabalho mundo afora tenho gastado muito, principalmente com correios… Mas não dá para parar e, no momento, estou produzindo um curta que se chama “147”, agora envolvendo personagens humanizados. Pretendo inscrevê-lo no “Festival de Tiradentes” deste ano. Além de “147”, estou elaborando o “George Caveira”, que está na gaveta, em fermentação, cujo personagem principal é uma espécie de esqueleto desastrado, um “Agente 86” de ossos.

Os Impublicáveis: Diante de tantos personagens, você é capaz de identificar algum vínculo entre você e as figuras que cria, algo de caráter autobiográfico?

Tannure: À Exceção do Lumis, que é míope como eu, não consigo me identificar com quaisquer de meus personagens. O meu verdadeiro alter ego é o “Capitão Kaus”, personagem que encarno quando me fantasio nos carnavais.

Os Impublicáveis: E quanto ao fim social de seu trabalho? Como você próprio diz, suas animações têm conteúdo ético. Quais ideais você tenta transmitir a partir de suas obras, principalmente as animações?

Tannure: O fim social é fundamental. Meus curtas têm narrativa com início, meio e fim, todos permeados por mensagens de paz, amizade, convivência social e valores que conduzam à tolerância, à preservação ambiental. Enfim, além de entretenimento, sempre há um toque que leva à reflexão acerca do que é necessário para tornar o mundo melhor.

Os Impublicáveis: Dedicando-se às animações você abandonou a câmera?

Tannure: Sim. Abandonei a filmadora, embora sempre ande com minha câmera fotográfica digital. Sinto falta de produções em live action, ainda que nelas sempre tenha de insertar alguns efeitos gráficos. Sempre gostei de brincar com as filmagens e as fotografias, principalmente em festas e confraternizações. Aliás, esse tipo de brincadeira com imagens tem me rendido contato com produtores do resto do mundo. Inclusive, participo de um projeto sueco – do Diretor Rasmus Tirzitis –, no qual fazemos, eu e outros produtores, o trabalho gráfico de um fanfilm de “Star Wars”.

Os Impublicáveis: Bem, como você sabe, nós somos “Os Impublicáveis”, e, nesta condição, não poderíamos deixar de perguntar sobre uma produção sua, impublicavelmente intitulada “Sábado 14”. Como surgiu esta idéia e o que você diz do filme?

Tannure: A idéia surgiu do nada. O objetivo era reunir os amigos e, com minha câmera VHS, novinha em folha, partimos para o sítio de um deles, onde fizemos o filme em três finais de semana. Não havia qualquer recurso e o filme virou uma verdadeira farra. Eu era o Jason. O título, “Sábado 14”, deve-se ao fato de as filmagens só terem ocorrido aos sábados. A coisa era tão improvisada que um dos personagens, numa seqüência rápida de cenas, chega a aparecer de cavanhaque, depois de barba e, por fim, só de bigode. Noutra cena, o Jason – eu – tropeça de verdade e chega a se machucar, sozinho, às margens da lagoa da Petrobrás, infestada de caramujos. Aliás, é nesta lagoa que cai o Jason em sua primeira aparição. A água era tão poluída que, na tentativa de evitar a contaminação dos atores, jogamos gasolina no espelho d’água e ateamos fogo…

Os Impublicáveis: O humor também é marcante em suas criações…

Tannure: Desde menino sou meio palhaço e acho fundamental a presença do humor em meu trabalho. Para mim, o curta legal é o que faz o público rir. Não me interesso por dramas. Aliás, sempre tive restrições em relação ao cinema nacional, devido à repetição de temas como violência e a miséria nordestina. De cinema brasileiro, prefiro as comédias da Atlântida, embora, na minha perspectiva, já veja alguns sinais de melhora nas produções. Gostei de filmes como “Estômago”, de Marcos Jorge, e “Pequenas Histórias”, do diretor Helvécio Ratton, os quais vi no “Festival de Tiradentes”. Ainda assim, continuo a preferir as produções americanas e inglesas, sendo admirador dos filmes japoneses de monstros.

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